Resenhas, artigos e contos

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Formação como Leitor #01 - Os primeiros e imprescindíveis contatos na infância

Como leitor, confesso que percorri uma estrada esburacada e sai dela diversas vezes. Não é uma tarefa fácil produzir um leitor fluente, ainda mais num país onde a leitura está longe de se tornar um hábito em boa parte da população. Mas essa postagem não será focada nas adversidades que dificultam a formação de leitores, e sim em meu relato pessoal de como me tornei um.

A lembrança mais longinqua de minha relação com os livros reside na infância. Não consigo precisar muito bem a idade, mas acredito que seja por volta dos seis ou sete anos. Lembro-me de uma caixa cheia de livros atraentes onde imagens e textos despertavam um sutil interesse em mim. Digo "sutil" porque às vezes não basta dar um livro na mão de uma criança e esperar que ela imediatamente leia por conta própria, ela precisa ser minimamente estimulada, precisa conceber que folhear um livro pode ser uma tarefa tão estimulante quanto outra qualquer, que o livro também pode ser seu "brinquedo". Não me recordo bem qual foi o meu estímulo, às vezes isso pode brotar da soma de vários fatores triviais, e acho que foi mais ou menos isso o que aconteceu comigo. Mas o fato de ter ganhado uma pilha de livros ajudou-me a ver aquilo com tanto brilho quanto um baú de tesouro. Então fui lendo, lendo e lendo até que devorei quase todos os livros; os que não tinham imagens eu quase não li. Mas algumas leituras ficaram marcadas em minha vida e compõem o material que forma a pilastra que sustenta meu "eu" leitor.



Maneco Caneco Chapéu de Funil, escrito por Luís Camargo, foi um dos meus livros infantis preferidos. Era pequeno, cheio de ilustrações e com uma historinha muito gostosa. Tratava-se de um personagem que ia se montando no decorrer da história a partir dos objetos não usados de uma casa. Um segundo título com este mesmo personagem é Panela de Arroz, um livro de adivinhações em que se aprende a fazer uma panela de arroz a partir dos ingredientes que são as respostas às questões - chega a ser cômico o fato de mesmo agora eu não saber fazer uma porção de arroz decentemente.



Uma terceira leitura marcante foi o livro Um Tesouro de Contos de Fadas, uma obra bem grossa e que devorei inúmeras vezes.  Meus contos preferidos eram: Hansel e Gretel, A menina dos fósforos, Ali babá e os quarenta ladrões a Bela e a Fera, Chapéuzinho Vermelho... bom, acho que quase todos. Não é um livro muito difícil de não adorar, pois toda criança é inclinada a ouvir um bom conto de fadas. E as ilustrações desse livro são muito bem feitas.



Mas os livros que eu mais adorei são as obras da coleção Salve-se Quem Puder. Eram livros ilustrados e com textos, e a trama girava em torno de algum mistério que o leitor tinha que desvendar. Os gêneros de cada título variavam: terror, suspense policial ou aventura. Cada capítulo terminava com uma pergunta ao leitor, um tipo de desafio sem o qual ele não poderia prosseguir com a leitura. Essas perguntas sempre eram relacionadas com a imagem da página, como por exemplo descobrir qual é o melhor caminho para o grupo de personagens, ou onde está escondido determinado objeto ou pessoa, e outras coisas do tipo. É justamente essa interação que fizeram desses livros uma leitura tão instigante. Infelizmente, eu possuí apenas alguns títulos: Assassinato no Avião da Meia-Noite, O Fantasma do Espelho, Em Busca do Templo Perdido, A Torre Mal-Assombrada, O Ônibus das Estrelas.

Todos os livros indicados acima que fizeram parte da minha infância ainda estão guardados dentro de um caixa, apesar de não muito bem conservados, já que passaram pelas mãos travessas do meu irmão mais novo que, por sua vez, ainda não tomou gosto pela leitura, pois prefere ficar jogando videogame ou ir no computador - é cada vez mais complicado estimular uma criança hoje devido ao grande número de distrações tecnológicas que não são bem reguladas pela família. Mas ressalto que não irei entrar nas deficiências de estímulo à leitura na infância.



Será que não estou me esquecendo de nada? Ah, claro! Quando se fala em leitura, não se pensa exclusivamente em livros. As histórias em quadrinhos também constituem uma ótima e recomendada atividade de leitura, sobretudo na infância. Por isso tenho uma grande consideração pelo Maurício de Souza. O que seria de mim sem a Turma da Mônica? Não houve personagens mais marcantes nessa época - excetuando-se personagens de anime - do que a Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali e todo o resto da turma. E até hoje me diverto pla calamba quando leio esses quadrinhos.

No que diz respeito à leitura, minha infância não chegou a carecer nesse aspecto. Mas confesso que fora muita sorte ter ganhado esses livros de graça, pois não tenho certeza se iria adquirir o gosto pela leitura se não fosse por isso. Minha família não possuía (e ainda não possui) o hábito de leitura, e quando o ambiente familiar não fomenta o gosto de ler na criança, esta deixa de ganhar um mundo vital para o seu crescimento. Se minha infância carecesse das leituras ilustradas nesse texto, eu sentiria um grande vazio dentro de mim, um vazio que poderia ser preenchido por um universo de possibilidades mágicas. 

Porém, meu "eu" leitor se apagou a proximidade de certa idade. Deve ter sido por volta dos 10 e 11 anos, da quinta série (sexto ano) do ensino fundamental em diante, que meu gosto pela leitura começou a sofrer um gradual e lento declínio. Como e por que isso aconteceu? Vocês irão conferir em breve.