Resenhas, artigos e contos

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Formação como Leitor #03 - Literatura é uma chatice!



Então chegamos ao Ensino Médio. O que dizer de minha experiência com os livros durante esse período? Um saco! É mais ou menos a resposta que está na ponta da língua de muitos adolescentes, quando indagados sobre a aula de literatura, ou pior, sobre a literatura. O motivo pelo qual isso acontece não é tão difícil de averiguar se conversarmos com alguém jovem. Particularmente, não preciso indagar a ninguém, pois participei ativamente desse problema gerado em sala de aula. Eu poderia separar uma, duas, três, infinitas postagens sobre o assunto, mas TENTAREI ser sucinto na questão e focarei apenas na minha própria experiência. 

Meu maior problema no Ensino Médio foram os (na época, malditos) clássicos. Eu ainda não compreendo (e acho que não quero) a “brilhante” ideia de forçar um estudante que pouco sabe as direções profissionais de sua vida a ler determinado livro simplesmente porque tem que ser lido. No final, descobrimos a resposta: vestibular. Então, chegamos à conclusão que a aula de literatura, um momento de desfruto da arte, é, meramente, parte de um sistema acadêmico que delimita suas extensões. Ou seja, é um ambiente penoso para o aluno que vê ali um curso como todos os outros, quando deveria ser algo completamente distinto dos demais. 

A questão crucial que todos precisamos levar em conta: a maioria dos brasileiros não lê, portanto, há adolescentes que também não leem. Feita essa observação, a primeira tarefa de um professor deveria ser estimular o aluno a ler antes de se sustentar num cronograma acadêmico, já dito, indubitavelmente limitado. Eu me encontrava justamente nessa questão. Não que eu não gostasse de ler, mas simplesmente não tinha o hábito. Os livros, como mencionei na última postagem dessa coluna, foram desgostosos nos últimos anos do Ensino Fundamental, e levei todo essa insatisfação para o Ensino Médio.

Todavia, antes dos clássicos da literatura brasileira, a professora nos deu um livro contemporâneo, uma ficção de suspense chamada O Corpo Morto de Deus, de Giselda Laporta Nicolelis. Era um livro interessante e dentro dos meus gostos de leitura, muito me recordava as aventuras de suspense que lia quando criança. Pensei, na época, que as próximas leituras seriam convenientes também, mas me enganei. De um livro de suspense passou para um romance social escrito décadas atrás; uma mudança radical.

Nem me recordo da ordem dos livros, mas posso listar O Alienista, Dom Casmurro, Vidas Secas, A Hora da Estrela, e outras leituras largadas tudo pela metade. Verdade seja dita: a maioria dos alunos sempre acessa um “resumo.com” e todos ficam felizes com seus trabalhos. Eu mesmo fiz isso. E não me arrependo nenhum pouco de tê-lo feito! Não conseguia (e hoje ainda não consigo) ver a obrigação de leituras tão fora da realidade do adolescente, embora haja como tais obras cativarem o estudante, caso o professor realize atividades mais dinâmicas e dê mais liberdade para interpretações dos alunos: menos foco nos instrumentos literários e mais na obra em si. Mas nisso ainda temos a primeira questão que mencionei: se o aluno não é leitor, é salutar fazê-lo ser. E não importa como um livro seja apresentado ao estudante, ele talvez nunca vá se interessar por ele, pois o fato de gostar ou não de um livro passa pelo próprio gosto do leitor, gosto esse que se modifica ao longo dos anos. Logo, é estupidez a obrigação de certas leituras na escola. O estudante de Ensino Médio é um leitor comum, e não um acadêmico; aquele lê o que quiser. Ler ou não ler é um direito sagrado de qualquer leitor.

Enfim, eu pouco discorri sobre meu histórico de leitura e escrevi sobre algo mais geral, mas não me incomodo. É uma visão calcada em toda minha experiência naquele período. A verdade é que o leitor dentro de mim foi completamente destruído por imposições que eu não queria obedecer: ler livros que eu não gostava simplesmente porque cairiam no vestibular. Além do mais, as aulas de literatura são excessivamente fissuradas em escolas literárias, conhecimento que poderia ser passado de modo sucinto ao aluno (já que, no final das contas, basta olhar resumos de internet), e pouco focado na obra em si.

Mas, como eu gostaria que a professora me recomendasse alguma obra de fantasia, ficção científica ou suspense policial! Eu iria ADORAR! Mas não foi assim. As aulas de literatura foram um saco!

Acredito que vocês devam estar me perguntando o que faço então numa faculdade de Letras se olhava a literatura de forma tão abominável, certo? A reposta para isso... na próxima postagem.

2 comentários

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Ótima coluna, Luiz! Realmente esse é uma situação muito complexa, que acaba prestando um grande desserviço à formação à literatura.
Quando eu estava no colegial teve um ano em que a professora decidiu mudar um pouco e ofereceu alguns livros da coleção Vaga-lume e nós podíamos escolher qualquer um deles para ler. E foi ótimo, li Office-Boy em Apuros numa boa, gostei, fiz um belo resumo. Pena que na maioria dos anos não foi assim.
Me lembro de ter sido obrigado a ler Senhora, de José Alencar, livro que eu achei um saco na época e continuo achando até hoje. Não que eu tenha nada contra os clássicos, ao contrário, gostei muito de Memórias Póstumas de Brás Cubas que comprei bem depois do colegial, por vontade própria.
Acredito que o melhor caminho seria oferecer (oferecer, não empurrar) livros escolhidos melhor de acordo com a idade e deixar os clássicos que caem no vestibular para os últimos anos do ensino médio. E até sugiro que usem livros de massa mesmo.
Pra mim, não importa se uma adolescente está lendo Crepúsculo (se quiser, ela procura algo mais complexo depois), o que importa é que ela está lendo.

Balas
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Joe, ouço dizer muito bem da coleção Vaga-Lume na formação de leitores adolescentes; acho muito mais viável que a utilização dos clássicos brasileiros. Outra referência nacional interessante são os livros do Pedro Bandeira e sua série Os Karas.
Como você acertadamente fez com o Memórias, os clássicos devem ser lidos por conta própria e não por obrigação de terceiros. Não precisamos insistir na leitura dos clássicos se o aluno não estiver preparado para lê-lo. Além do mais, a forma como esse livro clássico é apresentado também é muito importante. Particularmente, meu ideal de aula de literatura é um espaço aberto para discussões acerca de qualquer livro ao gosto do leitor, pois como cada um terá um tipo de literatura preferida, seria uma forma de "boca a boca" mediado pelo professor capaz de estimular o gosto por outros literaturas, Mas, enquanto a literatura estiver submissa ao vestibular teremos que contornar a situação.
"o que importa é que ela está lendo"... Tb acredito nisso.

Obrigado pelo comentário. Demorei para responder porque estava sem internet, rsrs.

Balas