Resenhas, artigos e contos

Resenhas, artigos e contos

[Resenha] Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley

Resenha publicada originalmente no blog Luizdreamhope em 23/08/2011

Editora: Globo
Ano: 2009 (primeira publicação em 1932)
Páginas: 398
Skoob
Onde comprar?
Saraiva

Sinopse: Ano 634 d.F. (depois de Ford). O Estado científico totalitário zela por todos. Nascidos de proveta, os seres humanos (pré-condicionados) têm comportamentos (pré-estabelecidos) e ocupam lugares (pré-determinados) na sociedade: os alfa no topo da pirâmide, os ípsilons na base. A droga soma é universalmente distribuída em doses convenientes para os usuários. Família, monogamia, privacidade e pensamento criativo constituem crime. Os conceitos de "pai" e "mãe" são meramente históricos. Relacionamentos emocionais intensos ou prolongados são proibidos e considerados anormais. A promiscuidade é moralmente obrigatória e a higiene, um valor supremo. Não existe paixão nem religião. Mas Bernard Marx tem uma infelicidade doentia: acalentando um desejo não natural por solidão, não vendo mais graça nos prazeres infinitos da promiscuidade compulsória, Bernard quer se libertar. Uma visita a um dos poucos remanescentes da Reserva Selvagem, onde a vida antiga, imperfeita, subsiste, pode ser um caminho para curá-lo. Extraordinariamente profético, "Admirável mundo novo" é um dos livros mais influentes do século 20.

Resenha


Um colega me apresentou um livro super interessante que até então apenas havia ouvido falar (e muito bem por sinal). Trata-se do romance Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley. Diferentemente das resenhas que escrevo, não me atentarei em alguns aspectos comuns a serem analisados num livro, como escrita, personagens, narração, linguagem; e sim no mundo da história e as reflexões que ela suscita, pois, assim que terminei a leitura, senti-me, no mínimo, impressionado e ao mesmo tempo atormentado. Tentarei não soltar spoilers durante minhas impressões; para quem ainda não leu essa obra, talvez fique curioso com os tópicos levantados. 

O cenário de Admirável Mundo Novo é distópico (ao contrário de uma utopia, a sociedade vive num mundo opressivo), embora, na verdade, eu o tenha achado parcialmente utópico durante as primeiras páginas. Aliás, para os próprios personagens que vivem neste mundo, eles se acham dentro de uma utopia. Afinal, se você está vivendo dentro de um certo panorama em que tudo está dando certo, tem-se a impressão de estar vivendo uma boa vida; mas isso até alguém se manifestar e começar a apontar os erros desse panorama — mesmo que não seja garantido que você consiga perceber esses “ultrajes” contra sua utopia. Houve sim, de minha parte, uma admiração por aquele mundo (o título do livro faz muito sentido, tanto por meio do leitor quanto do personagem "Selvagem" que, vivendo numa reserva onde ainda é preservada a espécime humana “não-civilizada”, idealiza o mundo além das reservas). Mas, lentamente, fui notando alguns aspectos bastante bizarros — sim, não encontrei outra palavra melhor se quisesse tomar como referencial a sociedade atual em relação àquela mostrada no livro.

Apenas para ilustrar uma dessas bizarrices, imagine um casal infantil de oito ou nove anos se divertindo juntos com brinquedos eróticos. Algo bem diferente, não? Aliás, a educação sexual na Londres futurística apresentada no livro gera uma sociedade muito diversa da nossa. Homens e mulheres não se casam, talvez eles nem mesmo saibam o que venha a ser isso. A palavra “amor” é extinta, ou seja, aquele calor que você sente dentro do peito em relação a uma pessoa é um sentimento inexistente, pelo menos em sua plenitude. O casal apenas se diverte praticando esportes, indo a cinemas sensíveis (um cinema também diferente do nosso), dançando e fazendo sexo. Devo salientar que a promiscuidade é bastante comum. Se o homem ou a mulher fica bastante tempo com um parceiro, isso é visto como um ato antissocial. Não há paixão, não há amor, há simplesmente prazer e “sociabilidade”. Quanto mais parceiros você tiver, mais social você se parecerá. Num mundo como o nosso, uma mulher desse tipo seria vista como uma prostituta, mas neste “Admirável Mundo” ela é tida como alguém de boa fama. 

 Se estiverem se perguntando onde estão os pais e as mães dessas pessoas, eles não existem. Isso mesmo! Não há pais, mães, nem irmãos, muito menos o que se poderia chamar de família. As pessoas vivem sem ter o mínimo conhecimento do sentimento tão comum que nos envolve quando estamos com nossos parentes, este sentimento de afeto que nos une aos nossos familiares é inexistente em Admirável Mundo Novo. O que existe é uma rotina diária pré-determinada em que você se relaciona com os demais membros da sociedade: vai ao trabalho, se diverte, e volta para casa unicamente para dormir. Não há espaço para pessoas antissociais e que gostam de ficar sozinhos. Por Ford! (expressão comumente usado na história que faz alusão a Henry Ford, e que equivale ao nosso “Por Deus!”), ser solitário é uma doença, a solidão é uma doença e completamente bizarra para tal sociedade. 

 (Londres futurística representada no álbum Brave New World, da banda Iron Maiden, baseado na obra de Huxley)

E, se por acaso, a pessoa estiver triste ou aborrecida, ela pode contar com o “soma”, uma droga que anula qualquer tipo de sofrimento. Em outras palavras, a pessoa vive para ser feliz e, quando a vida real tenta quebrar essa felicidade, ela pode recorrer a essa droga para que tudo retorne à normalidade. As doses diárias de “soma” não devem, de maneira alguma, serem abolidas, pois é imprescindível à felicidade do indivíduo. 

O indivíduo, aliás, não tem nada de indivíduo. Ele perde completamente sua individualidade para o Estado, que é quem realmente controla essa sociedade de todas as maneiras. Não há violência, rebeliões, assassinatos, ou qualquer outra coisa que possa perpetrar a paz que esse mundo oferece. O próprio Estado também é quem cria os seres humanos, pois como já ressaltei, eles não tem pais ou mães, nascem a partir de um processo de fecundação. 

Bom, eu sou terrível em Biologia, minhas notas nessa matéria nunca foram boas, então farei uma análise por alto sobre como se dá esse processo para gerar os seres humanos. As pessoas nascem artificialmente e são condicionadas, ou seja, elas nascem para ser um determinado tipo de pessoa e apenas aquele tipo de pessoa. Por isso, elas fazem unicamente o que foram condicionadas a fazer. A sociedade é dividida em castas, sendo a Alfa a mais inteligente e a mais privilegiada, e os Ípsilons, os mais subalternos. Um ponto interessante é que os Alfas odeiam a sensação de cogitar a possibilidade de terem nascidos como Ípsilons, e estes, por sua vez, não invejam os Alfas, pois se sentem confortáveis na posição menos privilegiada da sociedade: são felizes com o que fazem, com suas horas de trabalho para que no final delas recebam suas doses de “soma”. O fato é que todas as castas reconhecem o seu lugar, e devem ficar assim, para a conveniência do Estado que tem toda a sociedade da maneira que quer, como seus prisioneiros. Mas estes, por sua vez, se consideram felizes. É engraçado, eu falei em distopia no início. Para nós o livro parece ser completamente distópico, mas para eles, o lugar onde vivem é uma utopia. 

Um detalhe importante que vale ser refletido no livro é a expurgação da arte. Não há arte! Você não veria quadros como Monalisa ou leria romances de Shakespeare. Os livros nessa Londres são essencialmente teóricos, desprovidos de qualquer elemento que possa suscitar algum sentimento que desnorteie aquela sociedade perfeita. Nisso, nem a Bíblia escapou. 

A beleza também é uma preocupação freqüente entre eles, principalmente nas mulheres, que sempre procuram estarem bonitas para agradar aos homens. O corpo deve ser sempre esbelto, sem rugas, sem qualquer deformação. E a velhice, bom, eles também não ficam senis, graças aos maravilhosos produtos biológicos que deixam a pele rejuvenescida. 

O consumismo também é muito presente. O Estado apenas mantém o que consome. Por exemplo, os esportes praticados pela população são sempre custosos, pois necessitam de utensílios dispendiosos; todos os outros esportes que não dispunham de caros equipamentos foram extintos. 

    Enfim, é um livro muito interessante e um grande clássico. Seguindo essa mesma temática, temos outras obras como Laranja Mecânica (Anthony Burgess), 1984 (George Orwell), e Fahrenheit 451(Ray Bradbury).

5 comentários

Autor
avatar

Olá
Vim conhecer seu blog e retribuir a visita. Seu blog é um charme e seus textos são ótimos.
Quanto ao livro não conhecia, mas parece ser interessante.

Abraços!

Balas
Autor
avatar

Obrigado Érica.
O livro é realmente excelente para quem gosta da temática distópica. Vale a pena.

Abraços!

Balas
Autor
avatar

Oi, tudo bom ? Cheguei nesse blog através de uma busca sobre uma resenha do primeiro livro da Cassandra Clare. E, acabei me deparando com essa resenha sobre o Admirável Mundo Novo. Como faz nem três semanas, que o terminei, achei interessante ler uma outra opinião crítica sobre ele.

O livro, infelizmente, não me agradou. Não sou muito boa com as palavras, mas,vou tentar explicar a sensação que o livro me passou : faz parte daquele gênero de obra, que você sabe interiormente que é boa, principalmente pelo seu caráter crítico, mas que não deu aquele "clique" de : Putz, caramba, como eu nunca li esse livro antes...Faltou Aquele momento em que você fecha o livro, e olha estático para algum ponto, completamente inebriado pelas sensações que a obra te passa...

Mas, admito que o livro tem diálogos muito interessantes, principalmente, entre o selvagem e o Mustafá. O discurso do suposto selvagem pela defesa do livre arbítrio dos homens, principalmente, pela escolha de ser infeliz é brilhante. O mundo fictício criado pelo Aldous é um ponto que me fez demorar a entrar na história,a descrição inicial da forma que os homens são gerados é muito longa e meio sacal, pelo menos para mim.

e, talvez, a falta de um só protagonista fixo, como em 1984, não me fez criar nenhuma empatia por nenhuma personagem. Principalmente pela Lenina, poxa, porque a única mulher no livro não tem sua consciência crítica despertada como os demais personagens ? Afeeee, isso me deixou foi com raiva ! Tá certo que o livro foi escrito em 1932 e blá blá blá, mas, isso é angustiante !

Pois é, pode parecer confuso, mas eu gostei uns 30% e não gostei 70% do livro, talvez, se um dia, vai saber, bater uma vontade de reler a obra, eu encontre nuances que não tenha visto antes. Mas, até, então, vou fugir de outras obras desse autor.

Opa, desculpa, pelo comentário longo, eu sempre me empolgo quando o assunto é livros, e , por sinal, adorei seu blog ! Favoritando já !



Balas
Autor
avatar

Olá, Débora. O livro da Cassandra também está resenhado aqui, não sei se você chegou a ler, rsrs.

Sobre o livro do Aldous. Pra ser sincero, eu gostei mais do livro pelo seu conteúdo do que pelo seu desenvolvimento, achei-o um pouco lento no sentido de ritmo e movimento da história, mas eu fiquei tão fascinado pelo mundo criado que isso pouco fez diferença. É quase como ler Tolkien, um desenvolvimento muuuito lento, mas um universo extremamente rico.

Se você não gostou, tem todo direito de não gostar, hehe. Talvez seja coisa de "momento", sei lá. Há livros que lidos em certos momentos de nossa vida são maravilhoso, mas em outros são bem comuns ou bem ruins.

Eu não me recordo tão bem assim da história, pois faz tempo que a li - a resenha é de 2011 - mas há outros "despertados" que vão para uma tal ilha e lá vivem como humanos normais, certo? Acontece que o foco é realmente sobre um personagem, e dar o mesmo efeito em outros geraria uma revolução que não estaria nos planos da história.

Enfim, como disse, talvez você releia o livro futuramente. Dos livros que mencionei no final, ainda não cheguei a ler 1984. Em breve posto uma resenha do Farenheit 451, esse sim eu achei MUITO BOM! Só de pensar numa sociedade em que os livros são abolidos e queimados já me deixa tenso, hehe.

Se empolgue com livros! É uma sensação maravilhosa. =) Obrigado por favoritar o blog. Aguardo novas visitas.

Beijos.

Balas
Autor
avatar

meu deus... querem cotas de mulheres nos livros agora kkkkkkkkk (comentario sem nocao)

Balas