Os fãs pediram, e a editora JBC lhes atendeu. Fez-se “a
lei da troca equivalente”, e agora podemos ter em mãos o primeiro volume da magnum opus de Hiromu Arakawa, Fullmetal Alchemist. A editora havia
publicado o mangá há alguns anos, mas em um formato meio-tanko, que desagrada praticamente todos os leitores de mangá.
Dessa vez, porém, temos um formado tanko
(segundo a editora, uma edição de colecionador), com um acabamento semelhante
ao de Yuyu Hakusho. O preço de
R$16,90 é um pouco salgado, mas como Fullmetal
é uma história SENSACIONAL, vale cada centavo.
A primeira vez que assisti Fullmetal Alchemist foi na RedeTV, na época em que a emissora
também exibia Super Campeões. Por
mais bem falado que fosse, confesso que o anime pouco me interessou nos poucos
episódios que vi. Na verdade, o anime era praticamente “inassistível” na tv
aberta por causa da quantidade de cortes. Por isso só alguns anos depois, com a
segunda versão do anime (Brotherhood), pude apreciar a beleza que era a saga
dos irmãos Elric.
Usando a alquimia como temática e uma ambientação
baseada na Europa pós-revolução industrial, Fullmetal
Alchemist apresenta um enredo que se desvia das convenções do gênero shonen e aposta em um caminho mais
alternativo, assumindo, assim, tons de originalidade dentro do gênero. As cenas
de luta, por exemplo, ocorrem por uma necessidade da história, e não por uma
demanda do gênero. A própria alquimia, por seu viés científico, também não é
comparável a formas de energia como ki, chakra, cosmo e outras energias usadas
pelos personagens shonens para fins
de batalha.
Nesse primeiro volume, o principal atrativo não é o
desenvolvimento da trama, cujos capítulos são histórias fechadas que soltam
aqui e ali detalhes sobre esse universo, mas sim os irmãos protagonistas,
Edward e Alphonse Elric. A primeira página do mangá é uma entrada para uma
lembrança amarga de ambos os personagens, um erro que eles farão questão de
requentar em vários momentos da trama: a transmutação humana que tentaram fazer
quando crianças. Edward e Alphonse usaram seus conhecimentos de alquimia para
trazerem uma pessoa de volta à vida, mas o processo de transmutação deu muito
errado e eles acabaram pagando um alto preço por isso. Eventualmente, eles
descobrem que a única forma de reaver o que perderam é usarem a pedra filosofal.
A partir de então, eles partem em busca desse artefato, e essa jornada os leva à
cidade de Lior, onde se desenrola os primeiros acontecimentos do mangá.
Como assisti
aos primeiros episódios de ambos os animes, foi impossível não traçar algumas
comparações. Esse primeiro volume apresenta três mini-arcos, mas nem todos
foram adaptados nos animes. A versão Brotherhood suprimiu o terceiro e o quarto
capítulo da história, enquanto que a versão antiga eliminou apenas o terceiro.
O primeiro episódio de Brotherhood foi (provavelmente) um filler introdutório para os personagens, por isso não adaptaram o
quarto capítulo do mangá, que servia para introduzir o personagem Roy Mustang,
o alquimista das chamas. Quanto ao terceiro capítulo do mangá que não foi
adaptado em nenhuma das versões, a despeito de sua boa história, ele não
acrescenta quase nada ao enredo. Outra diferença diz respeito ao trágico
background dos irmãos Elric. No mangá, ele teve pouco espaço de
desenvolvimento, sendo limitado somente a algumas páginas de flashback, enquanto que as adaptações
animadas enriqueceram esse drama com novas cenas e diálogos comoventes.
Há também um viés filosófico na história, como o
conflito entre ciência e religião tratada nos primeiros dois capítulos.
Nós, alquimistas, somos cientistas. Não dá para ficar acreditando em coisas subjetivas como um deus ou criador. Nosso objetivo é decifrar todos os princípios e leis que regem este universo, na nossa busca infinita pela verdade... Não é irônico? A gente, que não acredita em deus, é quem age mais próximo ao território divino.
Edward Elric falando com Rose, uma seguidora fiel do
letoísmo.
É impossível não associar esse mesmo arco aos inúmeros
casos envolvendo o abuso de poder da igreja. Pessoas usam a religião como uma
tábua de salvação, agarram-se tão firmemente a ela que, mesmo mostrando que
estão sendo manipuladas por algum charlatão que extrapola os limites da fé (e
do dinheiro), elas continuam abraçadas a essa tábua, pois é a única que
conseguem enxergar. Obviamente, o mangá acompanha a visão ateísta de seus
personagens, portanto, em oposição à religião. Mas, nesse arco, o que é mais
colocado em cheque é a vulnerabilidade das pessoas diante de qualquer milagre
religioso, um tipo de crença que se opõe às crenças científicas, que necessitam
de provas concretas e/ou base teórica. Por outro lado, o mangá também atira
contra a ciência, e a tragédia dos irmãos Elric é a prova disso. Ressuscitar
uma pessoa é uma ação inscrita no território divino, e os personagens tentaram
fazê-lo por meio da ciência. Eles não apenas falharam como foram
“amaldiçoados”.
É uma pena ler esse mangá sem o sentimento de
ineditismo. Ainda assim, é uma leitura que vale muito à pena, principalmente a
partir do volume seguinte, que guarda um dos momentos mais tristes da série.
Nota:
4.0/5.0
2 comentários
Saber que trocaram o formato dá muita vontade de comprar os mangas, mas o preço ainda assusta um pouco (ainda mais por um manga que já li :/). Mas vendo que os preços estão subindo cada vez mais, acredito que esteja na média mesmo. E espero que dê o retorno esperado para que eles se ensaiem em outros relaunchs também.